Voltemos às perguntas formuladas na Introdução.
Em
primeiro lugar, o preparo, que consiste na educação e na instrução dos
componentes do grupo que se planeja, nos leva a outro quesito preliminar: —
quem devem ser os componentes?
A
tarefa começa, pois, com a seleção das pessoas que deverão participar dos
trabalhos. Como todo grupamento humano, este também deve ter alguém que assuma
a posição de coordenador, de condutor. É preciso, não obstante, muita atenção e
vigilância desde esta primeira hora. Esse motivador, ou iniciador, não poderá
fugir de certa posição de liderança, mas é necessário não esquecer nunca de que
tal condição não confere a ninguém poderes ditatoriais e arbitrários sobre o
grupo. Por outro lado, o líder, ou dirigente, terá que dispor de certa dose de
autoridade, exercida por consenso geral, para disciplinação e harmonização do
grupo. Liderar é coordenar esforços, não impor condições. O líder natural e espontâneo
é aceito também com naturalidade e espontaneidade, sem declarar-se tal. É até
possível que, nos trabalhos preliminares de organização do grupo, surja a sutil
faculdade da liderança em pessoas nas quais mais inesperada ela parecia. Nestas
condições, aquele que iniciou a idéia deve ter grandeza suficiente para
reconhecer que o outro, que revelou melhores disposições, está mais indicado
para a função do que ele próprio. Num grupo espírita, todos são de igual
importância.
O
problema das rivalidades é tão antigo como a própria mediunidade. O apóstolo
Paulo tratou dele, na sua notável Primeira Epístola aos Coríntios, capítulos
12, 13 e 14, e, especificamente, nos versículos 4 a 30 do capítulo 12. (1)
O primeiro
passo, portanto, que deve dar alguém que pretenda organizar um grupo mediúnico
é selecionar as pessoas que irão compo-lo. É bom que isto se faça mesmo antes
de se decidir que tipo de trabalho será executado — do que falaremos mais
adiante — e quem será incumbido da direção das tarefas. Os motivos são de fácil
entendimento. Em primeiro lugar, o problema da liderança a que acima aludimos:
é possível que a pessoa mais indicada para dirigir os trabalhos não seja aquela
que se propõe, de início, a organizar o grupo, cumprindo-lhe provar, no
decorrer das gestões preparatórias, a força tranqüila e segura da sua
personalidade. Em segundo lugar, o grupo será a soma dos seus componentes, disporá
das forças de cada um e terá como pontos fracos as fraquezas dos seus
participantes. Em terceiro lugar, a natureza dos trabalhos a serem programados
dependerá dos diferentes tipos de mediunidade que for possível reunir, do grau
de sensibilidade, tato, inteligência, conhecimento e evangelização de cada um e
de todos, e da qualidade do relacionamento pessoal entre os que se propõem
trabalhar juntos nesse campo.
Assim, não basta juntar alguns amigos e familiares,
apagar a luz e aguardar as manifestações. Que amigos e familiares vamos selecionar?
Essa tarefa é extremamente delicada e crítica, pois dela vai depender, em
grande parte, o êxito ou fracasso do grupo. Será recomendável que a pessoa que
pretenda fundar um grupo, mesmo de âmbito doméstico, de proporções modestas e
sem grandes ambições, guarde consigo mesma, por longo tempo, as suas
intenções; que se entregue à prece constante, à meditação e ao estudo
silencioso e demorado de cada pessoa; que examine, sem paixões e sem
preferências, com toda a imparcialidade possível, as potencialidades de cada
um, bem como os seus defeitos, virtudes, inclinações, tendências e
temperamento. Não nos devem guiar aqui as preferências pessoais: — “Vou incluir
Fulano ou Sicrana porque gosto dele ou dela.” É essencial que todos se estimem
no grupo, mas só isto não basta. Podemos amar profundamente uma criatura que
não ofereça condições mínimas para um (1) Seria
oportuna, sob este aspecto, a leitura do artigo “O Livro dos Médiuns de Paulo,
o Apóstolo”, em “Reformador” de fevereiro de 1974.
trabalho tão sério como esse. É claro, por outro
lado, que não éaconselhável incluir aqueles que, embora ofereçam outras condições
favoráveis, se coloquem na posição de adversários e críticos demolidores de
qualquer outro componente do grupo. Até a discordância ideológica acentuada,
mesmo em outros setores do pensamento, pode criar dificuldades ao trabalho.
Isto não quer dizer que todos tenham que pensar igualzinho, ou se transformarem
em criaturas invertebradas, sem idéias próprias, sem personalidade e opinião. A
franqueza é também um dos ingredientes necessários ao bom trabalho, desde que
não alcance os estágios da rudeza que fere, mas a homogeneização dos ideais e
das aspirações é condição importante para o bom entendimento que precisa
prevalecer durante todo o tempo. Um só membro que desafine dessa atmosfera de
harmonia, poderá transformar-se em brecha por onde espíritos desajustados
introduzirão sutilmente fatores de perturbação e eventual desintegração do
grupo.
É preciso entender, logo de início, que os
componentes encarnados de um grupo são apenas a sua parte visível, O papel que
lhes cabe é importante, por certo, mas nada se compara com as complexidades do
trabalho que se desenrola do outro lado da vida, entre os desencarnados. Lá é
que se realiza a parte mais crítica e delicada das responsabilidades atribuidas
a qualquer grupo mediúnico, desde o cuidadoso planejamento das tarefas até a
sua realização no plano físico, no tempo certo. Os componentes encarnados já
fazem bastante quando não atrapalham, não perturbam, não interferem
negativamente. É óbvio que ajudam de maneira decisiva, quando se portam com
dignidade, em perfeita harmonia com o grupo; mas se não puderem ajudar, que
pelo menos não dificultem as coisas. É melhor, por isso, recusar, logo de
princípio, um participante em perspectiva, sobre o qual tenhamos algumas
dúvidas mais sérias, do que sermos constrangidos, depois, a dizer-lhe que,
infelizmente, tem que deixar o grupo, por não se estar adaptando às condições
exigidas pelo trabalho.
É por isso que se recomenda uma longa meditação
antes de decidir quanto à composição humana do grupo, para não fazermos o
convite senão àqueles dos quais podemos contar com um mínimo de compreensão,
entendimento e entrosamento com os demais.
Isto nos leva a uma outra questão, que deve ser
logo decidida:
Quantos componentes encarnados deve ter um grupo? A
experiência recomenda que os grupos não devem ser muito grandes, pois, quanto
maiores, mais difícil mantê-los em clima de disciplina e harmonia. Léon Denis,
em seu livro “No Invisível”, sugere de quatro a oito pessoas. O grupo pode
funcionar bem até com duas pessoas, pois, segundo a palavra do Cristo, bastará
que dois ou mais se reúnam em seu nome, para que Ele aí esteja.
É claro, porém, que um grupo muito pequeno tem suas
possibilidades também limitadas. No caso de apenas dois, por exemplo, um teria
que ser o médium e o outro o doutrinador, e o médium não teria condições de
prolongar o trabalho sem grande desgaste psíquico, mas é certo que, mesmo
assim, alguma coisa séria poderia ser realizada. Acima dos oito componentes
sugeridos por Denis, vai-se tornando mais difícil a tarefa, não apenas do
dirigente encarnado do grupo, como de seus orientadores invisíveis, porque a
equipe se torna mais heterogénea, o pensamento divaga, quebra-se com freqüência
o esforço de concentração, e o prejuízo é certo para a tarefa. É possível, no
entanto, se alcançada impecável homogeneização, fazer funcionar razoavelmente
bem um grupo com mais de oito pessoas, mas acima de doze vai-se tornando
bastante problemática a sua eficácia.
É bom começar sem grandes ambições ou planos
grandiosos. O mais certo é que, ao se planejar a instalação de um grupo, ainda
não saibamos quanto à intenção dos espíritos que nos são familiares, nem
quanto à natureza dos trabalhos que pretendem realizar conosco. É certo,
porém, que, sempre que um grupo se dispõe a reunir-se, com a finalidade de
entrar em contacto com os desencarnados, estes se apresentarão no momento
oportuno. Isto é válido, tanto para os que se dedicam, com seriedade e boas
intenções, quanto para aqueles outros que se reúnem para se divertirem ou, pior
ainda, para práticas condenáveis. Se a intenção é apenas fazer passar o tempo,
virão os espíritos levianos, galhofeiros, fúteis e inconseqüentes, quando não
claramente mal-intencionados, do que poderão resultar obsessões penosas e
tenazes.
E, assim, chegamos a outro aspecto da questão: Para
que desejamos um grupo? Para simples estudo da Doutrina? Para conversar sobre
Espiritismo? Para oferecer condições à
manifestação de espíritos familiares, que venham trazer pequenas mensagens,
mais ou menos íntimas? Para experimentação e observação de na tureza
cientifica? Para tarefas mais sérias, de caráter doutrinário? Para os chamados
trabalhos de desobsessão?
Esse ponto somente pode ser decidido, em
definitivo, depois que tivermos selecionado os companheiros encarnados que vão
compor a equipe. Por isso, logo que tenhamos resolvido, no silêncio da
meditação e da prece, de que nomes deveremos cogitar para a composição do
grupo, convém convocar uma reunião, para exame e debate das inúmeras questões
que começam a colocar-se.
Essa reunião, obviamente não mediúnica, para a qual
deverão ser convidados aqueles cujos nomes foram lembrados para uma consulta,
será aberta com a leitura de um texto evangélico e uma prece. Em seguida,
aquele que tomou a iniciativa de convocá-la fará uma breve exposição de seus
objetivos e intenções.
A reunião será conduzida com descontração e
espontaneidade, à medida que cada um apresentar sua contribuição ao debate.
Serão arrolados os médiuns presentes, já atuantes, e os que tenham potencial
mediúnico suscetível de desenvolvimento.
Não está previsto no escopo deste livro um estudo
sobre o desenvolvimento da mediunidade, pois o assunto, bastante complexo, tem
sido tratado em várias obras de confiança, especialmente em “O Livro dos
Médiuns”, de Allan Kardec. Léon Denis também oferece contribuição valiosa, não
só em “No Invisível”, mas, também, em outras de suas obras. Recomenda-se,
ainda, André Luiz, em “Mecanismos da Mediunidade”, “Nos Domínios da
Mediunidade” e “Libertação”, bem como o livro interpretativo de Martins Peralva
“Estudando a Mediunidade”, todos editados pela Federação Espírita Brasileira.
Creio oportuno acrescentar que esses livros não se
dedicam especificamente a ensinar como desenvolver a mediunidade, e, sim, a
apresentar um panorama, tão abrangente quanto possível, dos diversos aspectos
dessa notável faculdade humana, muito mais comum do que tanta gente estaria
disposta a admitir.
Não há fórmulas mágicas, nem ritos especiais para
fazer eclodir a mediunidade numa pessoa que a tenha em potencial.
O desenvolvimento mediúnico é
trabalho delicado, difícil e muito importante, que exige conhecimento
doutrinário, capacidade de observação, vigilância, tato, firmeza e muita
sensibilidade para identificar desvios e desajustes que precisam ser prontamente
cor rigidos, para não levarem o futuro médium a vícios funcionais e até mesmo a
perturbações emocionais de problemática recuperação.
No passado remoto, esse encargo era de caráter
iniciático. O instrutor ia dosando seus ensinamentos segundo as forças e a receptividade
do discípulo, e este somente chegava aos estudos mais avançados de
desenvolvimento de suas faculdades se ao longo do processo viesse demonstrando,
sistematicamente, as condições mínimas exigidas para a tarefa a que se
propunha.
Evidentemente não há, hoje, necessidade de um guru
que leve o discípulo, por estágios sucessivos, até o ponto ideal. O Espiritismo
desmistificou o antigo ocultismo, tornando o conhecimento básico acessível ao
homem comum. Não nos esqueçamos, no entanto, de que a técnica do
desenvolvimento mediúnico ainda exige atenção, acompanhamento e orientação
pessoal de alguém que tenha condições morais e doutrinárias para fazê-lo. A
mediunidade, salvo casos especiais, não deve ser desenvolvida isoladamente e
sem apoio dos livros essenciais ao entendimento dos seus componentes básicos.
Colocado num grupo harmonioso e bem assistido, em
que funcionem médiuns bem disciplinados e já em plena atividade, épossível ao
médium incipiente desenvolver, pouco a pouco, suas faculdades. O dirigente do
grupo deve manter-se atento a essa possibilidade. De forma alguma, porém, o
treinamento mediúnico deve ser intentado com base em obras suspeitas ou
organizações que prometam resultados prontos e maravilhosos em algumas lições.
É também uma imprudéncia forçar o desenvolvimento sem nenhuma preocupação de
estudar a questão nos livros que compõem a Codificação de Kardec e a obra
complementar de seus continuadores.
Após esta digressão acerca do desenvolvimento
mediúnico, voltemos ao assunto em foco.
Ao cabo de algumas reuniões de debate e
ajustamento, o perfil do grupo que se pretende implantar já deve estar
suficientemente definido. Qualquer que seja a natureza do seu trabalho —
estudo, pesquisa, experimentação, desobsessão — não deve iniciar suas tarefas
especificas senão ao cabo de um aprendizado mais ou menos longo das questões
doutrinárias. Mesmo que os componentes da futura equipe se julguem
suficientemente informados e conhece dores da Doutrina dos Espíritos, vale a
pena uma revisão geral. Embora não gostemos de admitir, nosso conhecimento é
menor do que pensamos. Ademais, é difícil reunir um grupo de pessoas — seis ou
oito — que conheçam igualmente, e em profundidade, todas as obras essenciais à
tarefa a que se propõem. O mais provável éque o grupo se componha de gente em
diferentes estágios de conhecimento, desde aquele que tem apenas vagas noções,
até o que já possui conhecimentos mais profundos. Será útil para todos um
período de atualização de conhecimentos, a começar, naturalmente, pelo “O
Livro dos Espíritos”, seguido de “O Livro dos Médiuns”.
Para não prolongar demasiadamente este período de
revisão, deve ser dada prioridade à “Parte Segunda” de “O Livro dos Espíritos”,
que cuida “Do mundo espírita ou mundo dos Espíritos”, e à Segunda Parte de “O
Livro dos Médiuns”, a partir do capítulo 14 — “Dos Médiuns”.
A duração e freqüência das reuniões de estudo serão
objeto de debate e ajuste entre os componentes. Não é preciso fazer a leitura
de cada capítulo no decorrer das reuniões, desde que todos o tenham estudado,
segundo a programação acordada, durante o período que vai de uma reunião à
seguinte. A reunião se destina à verificação do progresso que cada um realiza
na revisão, e ao debate e esclarecimento das dúvidas surgidas. Seu objetivo
final será sempre o de homogeneizar os diversos graus de conhecimento
doutrinário, para obter a integração do grupo.
Não deve subsistir nenhuma preocupação com o tempo
despendido nesse trabalho preparatório, que poderá ser mais longo ou mais
curto, segundo o grau de conhecimento dos seus componentes, a boa-vontade e a
dedicação de cada um.
Por algum tempo, até que se consiga alcançar uma
fase de melhor preparo doutrinário, torna-se aconselhável serem evitadas as
manifestações mediúnicas, mesmo que haja no grupo médiuns já desenvolvidos. De
certo ponto em diante — e isto fica a critério daquele que se responsabiliza
por esta fase dos trabalhos — as tarefas mediúnicas poderão ser iniciadas em
paralelo com as de estudo. Nesse caso, o estudo precederá as manifestações e
deverá, ainda por algum tempo, que poderá ser longo, ocupar boa parte do
horário.
Nunca é demais enfatizar a importância e utilidade
desta fase preparatória, pois não apenas os encarnados se beneficiam dela, como
também os desencarnados que, certamente, começarão a ser trazidos pelos
benfeitores espirituais, para aproveitarem os ensinamentos ministrados. Esse
período é, ainda, muito útil para afinar o grupo, ajustar seus vários
componentes, revelar as tendências e potencialidades de cada um e, até mesmo,
por um processo natural de seleção, excluir, sem atritos ou desgosto, aqueles
que não se sentirem em condições de se entregar ao trabalho, que exige,
certamente, renúncia, dedicação, assiduidade, tolerância, estudo e amor. Os
impacientes deixarão o grupo espontaneamente, em processo de exclusão natural.
Não que sejam impuros (por favor!), mas por ser melhor que abandonem a tarefa
pela metade, do que insistirem em ficar, em prejuízo dos resultados. No
primeiro caso, estariam prejudicando apenas a si mesmos; no segundo, sacrificariam
todo o conjunto. Talvez em outra oportunidade, mais adiante, resolvam
dedicar-se com maior entusiasmo e firmeza. Tarefas como essas não podem ser
impostas, nem forçadas; têm que se apoiar num impulso interior, no desejo de
servir, de apagar-se, se necessário, dentro da equipe, de modo que os
resultados obtidos sejam impessoais, coletivos, não creditáveis exclusivamente
ao trabalho individual deste ou daquele componente do grupo. Quem não estiver
disposto a aceitar essas condições não está preparado para o trabalho.
A essa altura, portanto, o grupo já deverá estar
com o seu perfil suficientemente nítido. Já se sabe quais os que o compõem,
quais são os médiuns, quem se revelou com melhores condições de liderança e
tato na condução da equipe, e qual a natureza do trabalho a que esta deve
dedicar-se, bem como a duração e freqüência das reuniões (sobre o que
falaremos, ainda, em outro ponto deste livro).
É, então, chegado o momento de especificar a
finalidade e os objetivos do grupo.
A primeira grande divisão consiste em saber se o
grupo vai dedicar-se apenas a estudos ou a trabalhos experimentais. Não que uma
coisa exclua a outra, mas a definição é importante porque, como diziam os
antigos, quem navega sem destino não sabe aonde vai.
A natureza do trabalho pode variar bastante,
segundo os interesses e inclinações de seus componentes, especialmente
daqueles que se dedicam à organização da equipe. É possível que desejem apenas
a experimentação de caráter puramente científico, com ênfase na fenomenologia,
o que seria uma tarefa quase de laboratório. Não há muito a dizer aqui sobre
este aspecto, dado que o assunto escapa à minha área de competência e
experiência.
Alguns grupos, desinteressados do aspecto prático,
podem ser constituídos apenas para o estudo teórico da doutrina. Também são
válidos, é claro. Outros podem combinar o estudo teórico com a experimentação
científica ou mediúnica. Este livro está mais voltado para esta última opção,
e é sobre ela que nos fixaremos.
Suponhamos, pois, que o grupo se resolva pelo
trabalho de desobsessão.
Voltemos à imagem do filho. Já decidimos que
desejamos o trabalho, já nos convencemos, após algum tempo de estudo teórico,
de que estamos preparados para ele. Estamos igualmente dispostos aos
sacrifícios e às renúncias que o trabalho impõe. A tarefa precisa ser
desenvolvida com muita assiduidade e continuidade ininterrupta. Nem sempre
estaremos físicamente dispostos a ela, em virtude do cansaço, das lutas
naturais da vida diária, do desgaste e das tensões provocados pela atividade
profissional, dos inconvenientes oriundos de pequenas indisposições orgânicas.
O dia destinado à reunião exige renúncias diversas,
pequena-nas, mas às quais nem sempre estamos acostumados: moderação e
vigilância, por exemplo. Como os trabalhos são usualmente realizados à noite,
não podemos destiná-la ao convívio da família, aos passeios, às visitas, ao
relaxamento, à leitura de livro recreativo ou à novela de televisão. É um dia
de recolhimento íntimo, ao qual temos que nos habituar, aos poucos. Estamos
cientes disso.
Da mesma forma, encontramo-nos perfeitamente
conscientizados das responsabilidades que assumimos. Vamos nos defrontar com
espíritos desajustados que, no desespero em que se precipitaram, voltam-se contra
nós, muitas vezes sem razão alguma, senão a de que estamos tentando
despertá-los para realidade extremamente dolorosa, da qual se escondem
aflitivamente. A responsabilidade é grande, pois, e sabemos disso.
Encontraremos percalços e nos empenharemos em lutas remidas pelo bem. Mesmo
assim, desejamos o grupo. Um pouco de humildade nos fará, aqui, um bem enorme.
Não planejamos um grupo para reformar o mundo, nem
para conquistar todos os grandes espíritos que se debatem nas sombras. Haveremos
de nos preparar apenas para a nossa pequena oferenda. Os orientadores
espirituais saberão o que fazer dela, porque, muito melhor do que nós, estão
em condições de avaliar as nossas forças, recursos, possibilidades e intenções,
bem como as nossas fraquezas. O planejamento é realizado no mundo espiritual. A
nós, encarnados, caberá executá-lo, dentro das nossas limitações. De tudo isto
estamos conscientes. Tudo isto aceitamos. Resta o compromisso do amor
fraterno, que não pode ser parcial, condicionado, a meio coração, reservado;
tem de ser total. Começa com o relacionamento entre os componentes do grupo,
que precisa apoiar-se no perfeito entrosamento emocional de todos, para o que,
obviamente, é indispensável que todos se estimem e se respeitem. Sem isso,
impraticável seria doar o amor de que necessitam os irmãos desencarnados que
nos procurarem, movidos pela esperança secreta de que os conquistemos para as
alegrias do amor fraterno. É nessa oportunidade, que se renovará em todos os
encontros, que colocaremos em prática aquele sábio ensino de Jesus, que nos
recomenda amar os nossos inimigos. Muitos espíritos, em doloroso estado de
desajuste emocional, se apresentarão, diante de nós, como verdadeiros inimigos,
irritados, agressivos, a deblaterarem em altas vozes, indignados com a nossa
interferência em seus afazeres. Sem aquele amor incondicional que nos
recomendava o Cristo, como iremos oferecer-lhes a segurança da compreensão e da
tolerância de que tanto necessitam?
Estão resolvidas, portanto, as preliminares. Temos
o grupo montado e já definimos os seus objetivos. A próxima questão que se
coloca é: onde e quando reuni-lo?
Consideremos primeiro a segunda parte. A freqüência
as reuniões é usualmente de uma vez por semana, à noite. Dificilmente um grupo
terá condições de reunir-se regularmente, durante vários anos, mais de uma vez
por semana. Todos ou quase todos os seus componentes têm compromissos sociais,
familiares e até profissionais, que tornam impraticável reuniões mais
freqüentes. A noite é escolhida justamente porque, a partir de certa hora,
estão todos com as tarefas do dia concluidas. Uma boa sugestão seria reservar,
para os trabalhos mediúnicos, a segunda-feira, a partir de 20 horas ou 20h30m,
com duração máxima de duas horas. Justifiquemos a escolha da segunda-feira. Ê
que ela sucede ao repouso mais longo do fim de semana, quando já tivemos a
oportunidade de nos refazer das canseiras dos dias de atividade, tanto
profissional quanto no próprio grupo. Isto é especialmente válido para os
médiuns, nos quais o desgaste psíquico é sempre grande nos dias em que atuam.
O outro
aspecto da questão diz respeito ao local. As sessões podem ser realizadas em
casa ou convém buscar outro local, de preferência um centro, com acomodações
especiais? Alguns confrades temem a realização de trabalhos de desobsessão em
casa, com receio da influência negativa dos espíritos desarmonizados que são
atraidos. A questão é delicada e não pode ser respondida sumariamente, sim ou
não. Há uma porção de condicionantes. Se for possível um local apropriado, num
centro espírita bem orientado, o trabalho deve ser feito aí. Por outro lado,
num lar tumultuado por disputas, rivalidades, ciúmes, paixões subalternas e
desajustes de toda sorte, a realização de trabalhos de desobsessão poderá
agravar as condições, pois será difícil aos companheiros desencarnados, que
orientam o grupo, assegurar um clima de equilíbrio e proteção, tanto para os
espíritos trazidos para serem atendidos, como para as pessoas que vivem na
casa. Num lar normal, porém, o trabalho mediúnico equilibrado e bem dirigido,
sob a proteção de orientadores espirituais competentes e esclarecidos, pode
funcionar sem problemas e até com benefícios para a vida doméstica.
Isto não exclui a necessidade de vigilância e
atenta observação, pois é evidente que espíritos infelicitados pela desarmonia
interior tenderão sempre a transmitir sua perturbação àqueles aos quais tiverem
acesso, ou seja, àqueles que deixarem cair suas guardas, criando brechas por
onde penetrem emissões negativas e inquietantes. Mas isto acontece, haja ou
não haja grupo mediúnico reunido em
casa. O que nos defende da investida de companheiros
infelizes das sombras não é a realização de sessões bem distantes do local onde
vivemos, é a prece, são as boas intenções, é o desejo de purificar-se, de
aperfeiçoar-se, de servir. Para cobrar nossos compromissos, os espíritos
desajustados nos buscam em qualquer lugar, até nas profundezas de esconderijos
mais abjetos na carne, ou nas furnas do mundo espiritual inferior.
Por outro lado — e isto vai dito com bastante pesar
— nem todos os centros oferecem condições ideais para o difícil trabalho da
desobsessão. Pode haver casos em que o ambiente psíquico de uma instituição
esteja sob a influência de rivalidades, disputas internas, questões de ordem
material ou financeira, desorientações ou práticas que a Doutrina Espírita não
endossa e até mesmo condena formalmente. Em tais condições, torna-se muito
difícil um trabalho mediúnico sério e responsável. Os espíritos perturbadores
poderão encontrar meios para neutralizar tarefas que se anunciam, de início,
promissoras. Não quer isso dizer que não haja proteção e amparo por parte dos
espíritos bem-intencionados que nos assistem, mas, em todo relacionamento com o
mundo espiritual, há sempre a parte que compete a nós realizar. Essa, os
Espíritos não a farão por nós. Seria o mesmo que mandar os filhos à escola e
fazer por eles todos os deveres.
O que garante a estabilidade de um bom grupo
mediúnico não é a sua localização física, geográfica; é o equilíbrio psíquico,
emocional, daqueles que o comPõem. Em ambiente perturbado, no lar ou no
centro, qualquer grupo torna-se vulnerável ao assédio constante das vibrações
negativas que cercam os seus componentes. Se na vida diária, sob condições
perfeitamente normais, já somos tão assediados pelos cobradores invisíveis, é
claro que podemos contar com um esforço muito maior deles, quando nos dedicamos
à delicada tarefa de interferir com as suas paixões, ódios e rancores.
Por outro lado, antigos comparsas de erros passados
procuram sempre impedir que caminhemos pela senda áspera da recuperação, pois
sabem que é com esses processos que nos redimimos e nos colocamos ao abrigo de
suas investidas.
Nada de ilusões, pois. O trabalho de desobsessão
não é fácil, qualquer que seja o ambiente em que se realize, e, por isso, não
pode ser recomendado para um meio que, do ponto de vista humano, já se encontre
tumultuado e desequilibrado.
O cômodo destinado às sessões deve ser escolhido
com critério e extremo cuidado. Precisa ser suficientemente amplo e arejado,
para acomodar bem todos os participantes. Deve ser isolado, tanto quanto
possível, das demais dependências do prédio, sendo inadmissível, por exemplo,
para essa finalidade, uma passagem obrigatória para aqueles que não participem
dos trabalhos, como uma sala de entrada que dê para a rua. A qualquer momento,
uma pessoa da casa ou um visitante inesperado estaria tocando a campainha ou
batendo à porta, interrompendo o curso das atividades. O cômodo não deve ter
telefones que possam tocar subitamente, causando choques e perturbações àqueles
que se acham concentrados. Deve estar igualmente abrigado de ruídos de tráfego
ou gritos vindos da rua, sons de televisão ou rádio ligados nas redondezas.
Quando possível, deve ser provido de um condicionador de ar, para as noites de
verão intenso, dado que o mal-estar físico dos participantes dificulta
sobremaneira o bom andamento dos trabalhos.
Mesmo nos demais dias da semana, a sala onde se
realizam os trabalhos mediúnicos deverá ser preservada. Ë preciso evitar ali
reuniões sociais, conversas descuidadas, visitas inconvenientes, atos
reprováveis. O ambiente costuma ser mantido em elevado teor vibratório pelos
trabalhadores espirituais, o que se nota, especialmente nos dias de reunião,
ao se penetrar no cômodo.
O ideal, portanto, é ter um compartimento destinado
somente à tarefa mediúnica. Quando isso for impraticável, que pelo menos se
tenha o cuidado de usá-lo apenas para atividades nobres, como a boa leitura, a
música erudita, o preparo de artigos e livros doutrinários, o estudo sério.
Essa recomendação é tão válida para a hipótese de
se desenvolver o trabalho em casa, como no centro espírita. A proteção
magnética da sala mediúnica deve ser preservada com todo o cuidado, para não
viciar os dispositivos de segurança do trabalho, não perturbar a harmonia do
ambiente, não interferir com os meticulosos preparativos realizados pelos
companheiros desencarnados que dirigem e orientam as tarefas. Ademais, com
freqüência, alguns espíritos em tratamento ficam ali em repouso, por algumas
horas, de um dia para o outro, por exemplo, enquanto não são removidos para
instituições apropriadas.
Quem não puder manter essas condições mínimas, em
sua casa ou no centro, não deve tentar trabalho mediúnico de responsabilidade.
O ingresso na sala deve ser
feito apenas minutos antes do início da sessão. A recepção dos componentes e a
conversação inicial serão realizadas em outro cômodo, de vez que, por maior que
seja o cuidado, pode escapar um pensamento impróprio ou uma expressão infeliz,
numa conversa descontraída, especialmente porque, após o espaço de uma semana,
que usualmente vai de uma reunião à outra, quase todos gostam de relatar
experiências e acontecimentos. Torna-se, dessa maneira, mais difícil manter um
clima de absoluta vigilância. Com freqüência, os espíritos nos demonstram,
depois, no decorrer dos trabalhos, que se achavam presentes à conversação
prévia. Sempre que a conversa descamba para assuntos menos nobres, eles fazem
uma advertência amiga, pedindo que fiquemos nos temas de caráter doutrinário
ou, pelo menos, em conversa neutra. Quer isto dizer que são proscritos dessas
conversações prévias, por motivos mais que óbvios, os comentários sobre o
crime da semana, sobre o último casamento do astro da novela, a piada do dia,
ou a derrota do nosso time de futebol.
Em lugar desses assuntos, que deixaremos para as
frívolas reuniões sociais, a temática pode perfeitamente girar em torno de
questões doutrinárias. Uma boa sugestão é a de recapitular a semana, naquilo
que pode contribuir para ajudar o desenvolvimento do trabalho.
Freqüentemente, os médiuns e outros participantes
têm sonhos, recebem intuições ou pequenos avisos e conselhos de Espíritos
amigos, ou têm a relatar contactos mantidos, em desdobramento, com mentores do
grupo ou com os companheiros que estão sendo tratados ou que ainda virão a
manifestar-se. Essa técnica se desenvolve com o tempo. Depois que todos os
componentes do grupo forem alertados para as suas possibilidades e vantagens,
passam a observar com maior atenção os acontecimentos e anotar sonhos,
intuições e “recados” do mundo espiritual. É evidente que esse material deve
ser examinado e criticado com extremo cuidado, para que o grupo não se embrenhe
pela fantasia.
A experiência do pequeno grupo do qual faço parte
tem sido bastante positiva neste particular. De modo geral, os “sonhos”, que
são verdadeiros desdobramentos, trazem informações valiosas, que os espíritos
em tratamento posteriormente confirmam, no decorrer do diálogo mantido com o
doutrinador.
Geralmente, esses contactos são preliminares ao
trabalho, iniciado no mundo espiritual, antes que a manifestação se torne ostensiva
no grupo mediúnico. O tema é tratado mais amplamente em outro ponto deste
livro.
Minutos antes de iniciar a sessão, todos se
dirigirão, em silêncio, ao cômodo destinado aos trabalhos, e se sentarão em
torno da mesa. Cessaram, a essa altura, todas as conversas. Aquietam-se as
mentes, tranqüilizam-se os corações, desligam-se das preocupações do dia,
relaxam os músculos, e todos se predispõem ao trabalho.
A essa altura, a sala já está preparada pelos
responsáveis espirituais. No grupo do qual faço parte, um dos médiuns viu,
mais tarde, depois de recolhido ao leito, em retrospecto, toda a sessão, desde
o preparo da sala. Neste caso, o cômodo destinado às reuniões fica
completamente isolado do corpo da casa, tendo acesso apenas por uma passagem
externa. Cerca de duas horas antes, a sala está preparada físicamente para a
reunião: mesa e cadeiras em posição, a água destinada à fluidificação, os
livros que contêm os textos destinados à leitura, material para eventual
psicografia, papel, lápis, canetas esferográficas, o caderno de preces, o gravador
com a fita já também em posição para captar a mensagem final dos mentores do
grupo, uma pequena luz indireta, preferenternente de cor, pois a luz branca é
prejudicial a certos fenômenos mediúnicos. Sugere-se a cor vermelha.
Depois de todos esses preparativos, os
trabalhadores do mundo espiritual, segundo viu o nosso médium, em retrospecto,
inspecionam o cômodo, dando voltas em torno da mesa e providenciando para que
fossem estabelecidas certas “ligações” com o plano superior, através de
aparelhos e “fios” luminosos que se prendiam às cadeiras de cada membro. Esta é
a razão pela qual cada um deve ter seu lugar fixo em torno da mesa, uma vez que
os dispositivos ligados às cadeiras se destinam a fácilitar o trabalho,
atendendo a características específicas de suas mediunidades, bem como às
condições do espírito que será trazido para tratamento.
Outra recomendação, que parece útil, a esta altura,
ainda com relação à distribuição do pessoal em torno da mesa: sempre que
possível, o dirigente deve sentar-se de forma a ficar ao lado dos médiuns e não
face a face. Este conselho é ditado pela boa técnica de reuniões profanas, que
recomenda que duas ou mais pessoas, que vão debater um assunto, não devem
defrontar-se, para não exacerbar o antagonismo. A razão é puramente subjetiva e
psicológica. É mais fácil, a qualquer um de nós, alcançar um entendimento com
uma pessoa ao nosso lado, do que se ela estiver exatamente diante de nós. A
posição frente a frente parece levantar em nós os resíduos e os depósitos
acumulados pelos milênios em que enfrentávamos nossos adversários em lutas pela
sobrevivência. No caso das sessões mediúnicas, o objetivo não é disputar uma
peleja de vida ou morte, mas dialogar amistosamente com um Espírito em estado
de confusão e desespero, que desejamos despertar para uma realidade que ele se
recusa tenazmente a aceitar. Se opomos, à sua agressividade, a nossa, nada
conseguiremos. Tudo deve ser feito, pois, para eliminar qualquer empecilho que
possa existir entre o comunicante e o doutrinador.
Antes de prosseguir, façamos uma revisão geral na
sala.
Os móveis estão na posição certa e os lugares
predeterminados. Todos devem ocupar os assentos em silêncio, sem fazer alarido
e arrastamento ruidoso de cadeiras. Se há trabalhos de psicografia, o material
correspondente deve achar-se sobre a mesa: papel em folhas soltas, vários lápis
apontados e esferográficas, num copo ou outro recipiente apropriado. Se os
trabalhos forem mistos, ou seja, de psicografia e incorporação, convém que o
material não fique ao alcance dos médiuns de incorporação, pois um espírito
mais turbulento pode, num gesto brusco, atirar os objetos ao chão. Se há
psicografia, quem ficar ao lado do médium deve estar preparado para remover as
folhas, à medida que são escritas.
O caderno de preces destina-se a receber o nome dos
encarnados e desencarnados para os quais desejamos solicitar ajuda espiritual.
Os nomes devem ser escritos antes de começar a sessão, sempre em silêncio, sem
comentários. Pode ser adotado o processo de indicar com um pequeno sinal, em
forma de cruz, os nomes das pessoas desencarnadas. Na hora da prece, serão
mentalizados pelos interessados.
Lá está, igualmente, sobre a mesa, o livro que
contém o material de leitura preparatória, geralmente uma obra mediúnica
assinada por Emmanuel — “Vinha de Luz”, “Pão Nosso”, “Fonte Viva” —, ou por
outro autor da preferência do grupo.
A água destinada a ser fluidificada deve estar num
jarro de vidro, juntamente com pequenos copos, de preferência ao lado da mesa,
para que, num movimento mais violento, não sejam atirados ao chão. Não convém
que a água esteja gelada: um amigo espiritual nos disse, certa vez, que a água
à temperatura normal do ambiente se prestava mais facilmente à fluidificação ou
magnetização.
Quanto ao gravador de som, deve estar pronto para
entrar em ação com o mínimo de operações e ruídos: a fita em posição, microfone
já anteriormente testado, de preferência posto sobre um móvel ao lado da mesa
principal. Se emitir luz intensa de algum visor, este deve ser coberto com um
objeto opaco. No momento oportuno, bastará dar a partida. É conveniente, ao
testá-lo, gravar a data da sessão. No grupo que freqüentamos, o gravador é
reservado para a mensagem final, usualmente transmitida depois do atendimento
dos companheiros necessitados. Essas mensagens, acumuladas ao longo do tempo,
constituirão precioso repositório de ensinamentos e de experiência no trato com
os problemas do mundo espiritual, e devem ser preservadas para referência
futura.
Todos se encontram, assim, a postos.
As sugestões oferecidas a seguir não são, obviamente,
mandamentais, pois cada grupo acaba por encontrar a sua dinâmica própria,
dentro do roteiro mais ou menos comum a esse tipo de trabalho. Proporemos,
aqui, um roteiro típico, que pode, evidentemente, sofrer variações, a critério
de cada grupo.
Depois de todos acomodados e em silêncio, é feita a
leitura do texto do dia, geralmente, em seqüência, ou seja, um para cada
sessão. (A data da sessão deverá ser anotada ao pé da página.) Alguns grupos
costumam comentar o texto lido; tais comentários não devem ser muito longos,
nem elaborados, nem guardar tom oratório: serão singelos e sem retórica
bombástica.
Em seguida, a luz mais intensa
é apagada, restando apenas a lâmpada mais fraca, que forneça iluminação
discreta, de preferência em cor suave, indireta, apenas suficiente para se
distinguir o ambiente, as pessoas e os objetos. Convém retirar, neste momento,
os objetos que se encontrem sobre a mesa, pelas razões já apresentadas.
É feita a prece, que também não deve ser longa, nem
decorada, ou em tom de discurso: uma rogativa simples, na qual se solicite a
proteção para os trabalhos, a colaboração dos amigos espirituais, a inspiração
e a predisposição para receber os companheiros aflitos com amor, tolerância e
compreensão.
Finda a prece, todos ficam recolhidos, em silêncio,
concentrados, atentos, mas em estado de tranqüilidade e relaxamento muscular.
Em alguns grupos, o dirigente encarnado dos
trabalhos, ou o mentor espiritual, costuma designar previamente os médiuns que
irão atuar, fixando-lhes até o número de Espíritos que deverão atender, bem
como os médiuns que não deverão “dar passividade” a nenhum manifestante. Embora
se trate de uma posição respeitável e bem-intencionada, com o propósito
aparente de disciplinar as atividades do grupo, não é recomendável o
procedimento.
Procurarei apresentar as razões.
A designação prévia do médium pode criar neste uma
expectativa, e até certa ansiedade, que o leve a “forçar” uma comunicação, e
até mesmo levá-lo ao fenômeno do animismo, se não estiver bem preparado para a
sua tarefa e habituado ao exercício da mediunidade vigilante. Não convém
correr esse risco, pois nem todos os grupos estariam preparados para
identificar a dificuldade e corrigi-la. Por outro lado, não conhecemos, com
precisão, o planejamento realizado no mundo espiritual. É bem possível que convenha
encaminhar primeiro determinado Espírito, por determinado médium; e se, por
desconhecimento, designamos outro médium, altera-se a seqüência do trabalho
programado, o que acarretará adaptações de última hora, que vão sobrecarregar
os companheiros desencarnados. É que os Espíritos a serem tratados encontram-se
ali, no ambiente, e muitas vezes, depois de presenciarem um atendimento
particularmente dramático ou tocante, o próximo companheiro já vem predisposto
e mais receptivo à doutrinação. Os mentores do grupo conhecem bem esse
mecanismo e sabem melhor como dispor as manifestações.
Acresce ainda uma observação- Acreditam alguns que
esse processo de designar cada médium, de uma vez, evita que todos sejam
tomados ao mesmo tempo e se crie balbúrdia prejudicial ao trabalho. Na minha
experiência pessoal, nunca encontrei essa dificuldade. É freqüente
verificarmos que outros médiuns já se acham ligados aos próximos manifestantes,
mas, num grupo bem ajustado, os mentores terão recursos suficientes para
contê-los, até que chegue a vez de falarem.
Em suma: a seqüência da apresentação dos
desencarnados e a escolha dos médiuns, que irão atuar ou não, devem ficar a
critério dos dirigentes espirituais do grupo, que não têm necessidade de
anunciar-nos previamente o plano de trabalho da noite, para que ele se
desenrole harmoniosamente. Pelo contrário, quanto menos interferirmos, melhor.
É excusado dizer que a sessão deve ter hora
prefixada para começar e para terminar. Os companheiros necessitados devem ser
atendidos rigorosamente dentro do horário a eles destinado. Em hipótese alguma
deve permitir-se que, por iniciativa dos manifestantes, ou não, seja
ultrapassada a hora. Certa vez, tivemos a esse respeito uma lição preciosa.
Percebendo que a hora se esgotava, o espírito manifestante, muito
ardilosamente, começou a manobrar para ganhar tempo. Quando o dirigente lhe
disse que precisava partir, ele apelou para a boa educação:
— Você está me mandando embora?
E com essas e outras, o diálogo ainda se alongou
por alguns minutos. Terminado o atendimento, um dos orientadores recomendou-nos,
em termos inequívocos, que evitássemos a repetição do ocorrido. Explicou que o
trabalho mediúnico é protegido e assistido por uma equipe de segurança,
composta de obreiros do lado de lá. Esgotado o prazo, eles têm que se retirar,
de vez que outras tarefas inadiáveis os aguardam alhures, e o mecanismo de
segurança fica substancialmente enfraquecido. Os espíritos turbulentos,
sabendo disso, procuram demorar-se, para provocar distúrbios e levar o pânico
ao grupo, o que seria desastroso. A lição é importante.
Terminado o atendimento, enquanto se aguarda a
palavra final dos mentores, há uma pausa, que deve ser usada para uma pequena
prece, que ajuda a repor o ambiente em termos mais calmos, depois das várias
manifestações de companheiros aflitos, às vezes barulhentas e indignadas.
Concluída a mensagem final, que, como vimos, convém
gravar, para futura referência e estudo, os trabalhos são encerrados com uma
prece.
É hora dos comentários finais.
Há sempre o que comentar, após uma sessão
mediúnica. Épreciso, no entanto, que tais comentários obedeçam a uma disciplina,
para que possam ser úteis a todos. É que, usualmente, os Espíritos atendidos
ainda permanecem, por algum tempo, no recinto. Seria desastroso que um
comentário descaridoso fosse feito, em total dissonância com as palavras de
amor fraterno que há pouco foram ditas, pelo dirigente, durante a doutrinação.
Os manifestantes, no estado de confusão mental em que se encontram, tudo fazem
para permanecer como estão. Embora inconscientemente desejem ser convencidos da
verdade, lutam desesperadamente para continuar a crer ou a descrer naquilo que
lhes parece indicado. Se percebem que toda aquela atitude de respeito,
recolhimento e carinho é insincera,
dificilmente poderão ser ajudados de outra vez.
Por isso, dizia que os comentários devem ser
disciplinados. O dirigente deve perguntar pela experiência de cada um. Os
médiuns videntes sempre têm algo a dizer, pois percebem a presença desta ou
daquela entidade, ou têm acesso a fenômenos que usualmente interessam ao bom
andamento dos trabalhos ou trazem indicações a serem utilizadas na sessão
seguinte. Se o dirigente não dispõe do recurso da vidência, os médiuns videntes
do grupo devem ajudá-lo discretamente, com o mínimo de interferência, durante
os trabalhos. O mesmo se aplica aos médiuns clariaudientes. Os comentários
finais não devem prolongar-se por muito tempo. Geralmente, ao terminar a sessão,
é tarde da noite, e os componentes do grupo, especialmente os que moram longe,
precisam retirar-se, pois o trabalho os espera pela manhã do dia seguinte, com
as suas lutas e canseiras.
Mesmo que a sessão tenha terminado, o comportamento
de todos, ainda no recinto, deve ser discreto, sem elevar demasiadamente a
voz, sem gargalhadas estrepitosas, embora estejam todos, usualmente, felizes e
bem-humorados, por mais uma noite de trabalho redentor.
Antes de se retirarem, em ordem e discretamente, é
distribuída a água.
É preciso, porém, observar que o trabalho dos
componentes de um grupo mediúnico não termina com o encerramento da sessão.
Mesmo durante o espaço de tempo que vai de uma reunião à próxima, de certa
forma todos estão envolvidos nas tarefas. Inúmeras vezes, os Espíritos em
tratamento nos dizem claramente que nos seguiram em nossa atividade normal.
Desejam testar a boa-vontade, avaliar a sinceridade, ajuizar-se do
comportamento de cada membro do grupo, especialmente do médium pelo qual se
manifestaram e do dirigente que se incumbiu de doutriná-los, É preciso que se
tenha o cuidado para não pregar uma coisa e fazer outra inteiramente diversa.
Por outro lado, aqueles companheiros particularmente enfurecidos tentarão, no
desespero inconsciente em que se acham, envolver-nos com seus artifícios. Se,
no decorrer da semana, oferecemos brechas causadas por impulsos de cólera, de
maledicência, de intolerância, de invigilância, enfim, estaremos admitindo, na
intimidade do ser, emanações negativas que os companheiros infelizes estão
sempre prontos a emitir contra nós, na esperança de nos neutralizar, para que
possam continuar no livre exercício de suas paixões e desvarios. Todo cuidado é
pouco. Nos momentos em que sentirmos que vamos fraquej ar, recomenda-se uma
parada para pensar e uma pequena prece, qualquer que seja o local onde nos
encontremos. Os irmãos desesperados certamente nos cobrarão, no próximo
encontro, as fraquezas que conseguiram identificar em nós. É claro que não nos
podemos colocar como seres puríssimos e redimidos, incapazes de errar.
Estejamos, assim, preparados para uma interpelação, pois eles o farão,
certamente.
Certo Espírito, em grande estado de agitação —
desencarnação recente, em circunstâncias trágicas — me pediu que falasse com sua
mãe, que eu conhecia. Embora eu não o tenha prometido, pois não tinha ainda o
que dizer à pobre senhora, o Espírito me cobrou, logo na sessão seguinte:
— Você não falou com a minha mãe!
Respondi-lhe que não tinha ainda uma palavra
tranqüilizadora para dizer a ela, e não podia, evidentemente, falar do
verdadeiro estado de aflição em que se encontrava ele.
Outro me disse, ao cabo de uma semana
particularmente angustiosa para mim, em virtude de terrível pressão de
problemas humanos, que nada tinham a ver com o trabalho mediúnico:
— Esta semana eu quase te peguei. Ainda te pego!
É oportuno colocar, aqui, um argumento muito
válido, em favor da continuidade dos trabalhos e da assiduidade dos médiuns.
Como não ignoram, aqueles que cuidam desses problemas, os mentores espirituais
escolhem, para cada manifestante, o médium que lhe seja mais indicado pelas
características da mediunidade ou pela natureza do trabalho a ser realizado.
Feita a ligação, o Espírito, ao voltar, nas vezes subseqüentes, virá usualmente
pelo mesmo médium. Se o médium falta, o trabalho junto ao sofredor fica como
que em expectativa, suspenso, aguardando a próxima oportunidade. Assim, a não
ser por motivos muito fortes e justificados, a assiduidade dos médiuns e a
continuidade do trabalho são vitais ao seu bom rendimento.
Ainda uma sugestão. É sempre útil que alguém se
incumba de anotar, num caderno, um resumo do trabalho realizado em cada
reunião. Isto não é, porém, uma ata, a não ser que a sessão seja de pesquisa.
Quando se trata de tarefa de desobsessão, não é preciso ir a esses rigores. A
prática de reproduzir sumariamente os principais aspectos de cada manifestação
se revelou sempre de grande alcance, não apenas na condução dos trabalhos, mas
também, para o aprendizado constante que representam as tarefas mediúnicas.
Anote-se a data e, querendo, o número de ordem da
sessão, para referência. Descreva-se cada manifestação e faça-se um resumo do
diálogo mantido com o Espírito. Se a comunicação final for gravada, basta uma
referência identificadora. Essa tarefa deve caber, de preferência, ao dirigente
ou a alguma pessoa que se mantenha lúcida — sem transe mediúnico — durante toda
a sessão.
Sugere-se, como modelo, a série de livros
publicados pela Federação Espírita Brasileira, sob o título “Trabalhos do
Grupo Ismael”, preparados com extremo cuidado e competência pelo Dr. Guillon
Ribeiro.
Lamentavelmente, esses livros se acham, hoje, esgotados,
mas bibliotecas especializadas dispõem de exemplares, para consulta.
Livro: Diálogo com as Sombras
Hermínio
C. Miranda
Francisco Rebouças